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O que não te mata, pode te tornar tóxica.

 



A vida parecia ótima, tudo estava sob controle e as coisas finalmente começaram a acontecer profissionalmente. Mas como um daqueles plot twists irritantes conheci uma pessoa que me ofereceu muito do que posso chamar de “tough love”.

Ele gostava de se imaginar como um mentor ou algo assim, mas a verdade é que na atitude dele tinha um misto de “você é brilhante” com “sou muito melhor que você” bem no estilo Whiplash. Até hoje fico confusa se odeio aquele professor ou se o considero levemente.

Poderia passar horas falando sobre esse personagem importante que jogou verdades duras na minha cara, mas esse texto não é sobre ele, é sobre como um soco bem dado me fez acordar para algumas coisas necessárias. A verdade é que sempre me orgulhei de ser “mais eu” e isso quer dizer que:


1 — Tenho opiniões fortes e sempre tive coragem de bancar todas elas.

2 — Tenho força e coragem o suficiente para ir atrás do que eu quero e ter 75% de aproveitamento em todos os sonhos que já tive.

3 — Não sou obrigada a nada e exijo respeito, talvez de uma forma mais dura que o normal.


Esse sistema me colocou em muitos problemas. O mundo é masculino e esse tipo de postura não teria como ser mais incômoda em ambientes que desejam tanto que mulheres sejam educadas, resignadas e que me perguntou tantas vezes “quem você pensa que é?”

Devo dizer que mesmo sem ter nenhum centavo no bolso, perspectivas limitadas e ninguém que pudesse cobrir minhas dívidas caso tudo desse errado, ser “lembrada” que sou negra, pobre, burra ou feia me limitou por muito tempo até que todas essas palavras virassem parte de mim e me dessem força para pisar duro.

Uma postura arrogante não te faz ser a pessoa mais querida do mundo, mas a confiança e a coragem fazem você trazer alguns prêmios para casa.

Depois de ser ameaçada de estupro em tom de brincadeira no meio de uma sala cheia de gente e depois de reagir ao assédio, ser excluída das redes sociais de todos os homens da agência ou depois de ter a mão de um chefe descansando na minha bunda por mais de 3 minutos em uma situação de completa vulnerabilidade que até hoje me causa calafrios, eu comecei a tolerar muitooo menos.

Intensa no trabalho, distante nas relações. Metida e insuportável alguns poderiam dizer. Uns por inveja e outros porque somente quiseram a chance de me conhecer um pouco, quando eu não estava disponível para isso. E é aí onde quero chegar. O mundo pode ser cruel o suficiente com a gente para nos tornar cruéis com os outros e isso é péssimo para o maior objetivo de todo mundo…ser feliz.

Claro que temos o direito de nos sentirmos bravos, claro que todos esses acontecimentos e todos os outros que não caberiam neste texto se tornam parte de quem sou. Afinal, são as quedas que formam o nosso caráter. Mas quando a sua força é um substrato de ser tão pisado, você pode acabar perdendo algumas noções importantes como:

1 — Você é mais forte que a maioria das pessoas. Um soco seu pode ser devastador para alguns.

É como ter um super poder, insurgir de tanta dor te ensina a ser mordaz o tempo todo e esse é um dom incrível, mas você precisa aprender a usar no momento certo, pelo motivo certo e com as pessoas que realmente merecem.

2 — Você aguenta mais do que a maioria das pessoas.

Isso pode te fazer perder a mão para identificar situações que são mais desconfortáveis do que deveriam ser, e estipular limites que te salvem de relações tóxicas independente da natureza.

Também pode te fazer mais cruel e exigente com a pessoa que você mais deveria amar em todo esse mundo. Você mesma.

E de brinde, ainda cria expectativas irreais sobre outras pessoas que nem de longe conseguem ser o quem você é.

3 — Você deixou que pessoas ruins determinem o tipo de pessoa que você é ou será.

Acreditem em mim, eu sei que o raciocínio é não passar por mais nada daquilo, eu sei que você só quer se defender porque prevenir é sempre melhor que remediar.

Mas olhe para você e se analise de uma forma sincera.

Será que suas atitudes, seu tom e a forma que reage a tudo não são somente as vozes dos seus algozes reverberando na sua? Reflita com carinho.

Você quer mesmo que aquele bando de fdp que passaram pelo seu caminho e que lhe causaram tanta dor, sejam aqueles que determinam a forma que você lida com suas próximas relações?


A minha proposta é para que conheça e reconheça a sua história. Terapia, entender como o seu cérebro funciona com algumas doses livros de psicanálise, muitoooo tempo com você mesma e com pessoas que gostem de você o suficiente para falar verdades duras com carinho.

Eu sei que revisitar tudo isso pode ser muito doloroso, vai ser bizarro, mas o autoconhecimento que esse processo traz, vai te permitir ir muito mais longe.

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